Brasília | Por CLÁUDIO CASSIANO

Em sua primeira visita ao Brasil desde que assumiu a presidência da Argentina, Javier Milei desconsiderou o protocolo tradicional dos chefes de Estado ao não se encontrar com o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva. Ele também referiu-se ao principal adversário de Lula, Jair Bolsonaro, como um “perseguido judicial”. Bolsonaro, aliado político de Milei, é investigado pela Polícia Federal em um esquema de desvio de joias do acervo presidencial.

Milei desembarcou em Balneário Camboriú, Santa Catarina, no sábado, sendo recebido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e pelos governadores Jorginho Mello (PL-SC) e Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP). No domingo, ele participou de um congresso conservador. Em seu discurso, Milei não mencionou diretamente o presidente Lula, mas fez críticas contundentes aos governos de esquerda na América Latina.

A relação entre os presidentes da Argentina e do Brasil tem sido tensa desde a campanha de Javier Milei, que frequentemente criticou Luiz Inácio Lula da Silva. Na semana passada, Milei chamou Lula de “corrupto” e decidiu não participar da Cúpula do Mercosul no Paraguai, preferindo comparecer à Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC) em Santa Catarina. O Itamaraty orientou Lula a não responder às provocações, mas acompanhou de perto as ações de Milei, caso a situação se agravasse.

Milei subiu ao palco por volta das 17h, sendo recebido com aplausos e gritos de “Lula, ladrão, seu lugar é na prisão”. Ele expressou sua gratidão pela recepção calorosa de Bolsonaro, afirmando sentir-se “em casa e sempre bom estar entre amigos”.

— Vejam o que aconteceu na Venezuela e na Bolívia em 2019, quando Evo Morales insistiu em um terceiro mandato inconstitucional. Observem a perseguição judicial que nosso amigo Jair Bolsonaro está enfrentando aqui no Brasil e o que está acontecendo na Bolívia agora mesmo; estão dispostos a fabricar um falso golpe de Estado — declarou Milei.

Mais cedo, o presidente argentino se reuniu com empresários e políticos de direita. Ele foi a principal atração do evento, que se inspira na conferência homônima realizada nos EUA desde os anos 1970 e trazida ao Brasil pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP). A edição deste ano foi considerada “a maior da história” pelos organizadores. Além de Milei, o evento contou com a presença do chileno José Antonio Kast, ex-candidato à presidência do Chile; do ministro da Justiça de El Salvador, Gustavo Villatoro; e do ministro da Defesa da Argentina, Luis Alfonso Petri.

Durante o evento, os palestrantes trataram Bolsonaro como a única opção e enfatizaram que os apoiadores não deveriam considerar um plano B, mesmo com alguns governadores aliados já se apresentando como pré-candidatos. O próprio ex-presidente mencionou a possibilidade de uma “mudança de composição” no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a atuação do Congresso como formas de reverter sua situação jurídica, já que Bolsonaro está inelegível até 2030.

As eleições municipais deste ano foram um tema recorrente, com palestras ensinando os pré-candidatos a usarem melhor as redes sociais e a adotarem uma “cartilha bolsonarista” caso sejam eleitos, especialmente no Legislativo.

A pauta de costumes foi menos destacada, embora muitos participantes usassem adesivos com a frase “bebê não é monstro”, em referência a um projeto de lei que equipara a interrupção da gestação a partir da 22ª semana ao crime de homicídio simples. Pedidos de anistia aos condenados pelo 8 de janeiro, a defesa do acesso amplo a armas e críticas à imprensa também foram temas frequentemente abordados.

Enquanto os discursos no CPAC destacavam Jair Bolsonaro como a principal liderança da direita e a única opção para 2026, ficou claro entre o público que há espaço para outros nomes se destacarem. Tarcísio de Freitas foi um dos mais populares, recebendo elogios e sendo muito procurado para fotos e apertos de mão. Na manhã de domingo, dezenas de pessoas em frente ao hotel onde ele e outros bolsonaristas estavam hospedados o saudaram com frases como “parabéns pelo trabalho” e “nosso futuro presidente”.

Outro destaque foi o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), conhecido por sua forte presença nas redes sociais e discurso evangélico, que foi aplaudido ao falar da trajetória de Bolsonaro. Além dele, outras figuras foram muito procuradas para fotos, incluindo os deputados federais Ricardo Salles (PL-SP) e Mário Frias (PL-SP), o filho 04 de Bolsonaro, Jair Renan, e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto.